quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Capítulo XI - Um pouco de magia

_Lenwo, meu filho! Que bela surpresa! _Disse-me minha mãe ao mesmo tempo em que me abraçava e me beijava.

_Aiya, Ammë! Mestre Hortinin permitiu minha saída da ordem para visita-los!

_Calmcacil! Lenwo está aqui, veio jantar conosco!
_Que ótima notícia, amor! _ouvi meu pai responder de algum lugar dentro da casa.
_Vamos yondo, entre e senta-te um pouco!

Entrei e meu pai veio ao meu encontro, deu-me um forte abraço e sentamo-nos sobre largas almofadas na sala. Minha mãe trouxe um pouco de suco de maçã, nos ofereceu e sentou-se ao lado de meu pai.

_Yondo, ficamos feliz em receber tua visita, contudo Lässië e eu estamos um tanto preocupados com as decisões tomadas hoje na sede da ordem. _Falou-me meu pai com um pesar na voz _ Sabemos que foi a melhor decisão, mas isso não tira nossa angústia de saber que tu irás para a guerra...

Vi lágrimas formarem em seus olhos e senti-me um pouco culpado por isso. Sentei-me mais próximo deles e disse:

_Tenham calma! Tudo vai ficar bem!
_Assim seja! _ respondeu minha mãe _Vamos jantar, hoje não é dia pra tristezas, ter-te em casa é dia de festa!

Ela levantou e foi buscar a comida para a janta, olhei meu pai, ele tentava se animar, mas era deveras transparente e eu sabia que ele iria demorar um pouco a sorrir de novo.

Entre saladas, frutas, suco e a deliciosa torta de amoras da minha mãe, conversamos sobre diversos assuntos. Meu pai falou sobre a colheita do linho e o fornecimento das fibras. Minha mãe falou-me de Vanimë e que praticamente todos os dias ela a visitava com ou sem a mãe.

_Tua sobrinha pergunta sempre por ti! Sei que Paussin deve ter falado a ela das viagens que fez contigo.
_Provavelmente, Ammë! Um dia desses conversávamos sobre ela. Incrível isso,
moramos na mesma cidade e passo pouco tempo com minha sobrinha.
_Yondo, sabemos que teus estudos ocupam muito do teu tempo. _ falou –me meu pai _ Não te sintas culpado!
_Sim, atya, mesmo assim sinto falta de vós, ao menos sei que no próximo ano não precisarei de permissão para sair da ordem nos tempos de folga, assim poderei estar mais presente.

A conversa ainda se estendeu. Narrei-lhes o ocorrido na sede da ordem de Civits e tudo o mais que havia se passado nesses últimos dias.
Já tinha mais de um mês que não recebia permissão para sair da ordem e naquele momento eu percebi como me fazia falta apenas sentar e conversar com meus pais.

Calmcacil yondo-Later, meu pai. Cultivava linho para tecido, poderia se dizer que os campos sobre sua supervisão vestiam toda a Haendelle. Uma pessoa calma e como disse antes, transparente, pois seus olhos castanhos demonstravam nitidamente o que sentia e minha mãe diz que ele sempre foi assim, desde pequeno.

Lässië yende-Nator, minha mãe. Botânica e trabalhava no Horto lacrado da cidade. Graças a ela e a sua vontade de explicar como a natureza funcionava que trabalhei no Horto e depois decidi entrar para o druinato. Sempre que precisei, ela estava por perto, fosse fisicamente, ou por cartas vindas por um pombo. Sempre tinha uma resposta para cada pergunta, mesmo que a resposta fosse: “não achas que se questiona demais sobre esse assunto?”. Seus olhos verdes sempre me foram como um farol a me guiar no cruzeiro da vida.

Enquanto conversávamos, parei para pensar. Meus pais tinham mais de dois mil anos. Parece que sempre serei uma criança ao lado deles. Pensei nisso e sorri.

***

O Sábado mostro-se um dia lindo. A temperatura que voltava a subir denotava a chegada da primavera para dali a menos de duas semanas.

Leite com mel, pães e queijo para nosso desjejum, percebi que o ar triste de meus pais não pairava mais naquela casa, pois meus pais sorriam e se beijavam a cada encontro ou esbarrão.
Alguém bateu à porta e minha mãe atendeu.

_Aiya, Ammë! _ reconheci a voz da minha irmã _ Nada me fez segurar essa meninaem casa depois que Paussin a disse que Lenwo estava aqui!
_Aiya, Öammë! Posso ver öhanno Lenwo?
_Claro que sim, minha pequena flor!

Apenas tive tempo de ver aquela menina se jogar sobre mim, fazendo-me cair sobre as almofadas.

_Öhanno Lenwo! Que saudades!
_Também senti saudades, pequena flor!

Minha irmã se aproximou de nós e disse:
_Que lindo não é Vanimë! Derrubaste teu Öhanno, não percebeste que ele ainda estava lanchando?
_Aiya, nettë! Não brigue com ela, provavelmente eu teria feito o mesmo!
_Aiya, hanno! Tudo bem, entendai-vos! _minha irmã respondeu enquanto ia falar com meu pai que ria de sua neta arteira e sua filha encabulada.

_Öhanno Lenwo, tenho algumas perguntas para ti, poderias me responder? _ perguntou-me a bela criança com seus olhos castanhos brilhando de expectativa.
_Creio que sim, Vanimë, se estiver ao meu alcance, responderei.
_Oba! Poderias me explicar o que é magia e como funciona?
_Esperava que fosse esse o assunto, teu pai me disse que estás interessada no druinato.
_Sim! O escriba explica um pouco sobre as atividades da cidade e pergunta sobre o que nos interessa, mas eu não sei muito sobre o druinato...
_Pois prepara-te para a pequena aula!

Vanimë sorriu e ficou atenta. Minha irmã conversava com meus pais animadamente. Dei um copo de suco de maçã para minha sobrinha e voltei a falar:

_Vanimë, quem é nosso Criador?
_O Altíssimo!
_Quem é a nossa Protetora espiritual?
_Viviane, a senhora do Grande Lago!
_Muito bem! Então pergunto-te se existe alguma regra para que a natureza funcione!
_Sim, para tudo há início, meio e fim, em proporções diferentes, mas essa é a regra, criada pelo Altíssimo.
_Essa regra se aplica aos elfos?
_Sim, embora não tenha havido um elfo que tenha morrido de velhice ou doença, não somos imortais. Podemos morrer de forma provocada ou quando o altíssimo assim o desejar.
_Tens estudado, pequena flor!
_Só um pouco öhanno!
Bem, já sabes da existência de uma regra simples para a natureza,então posso te dizer que magia é realizar um evento através da vontade, fazendo com que ele aconteça sem ter uma explicação visível ou racional, ou seja, sem passar pelo inicio, meio e fim para que o evento aconteça.

Vanimë me mirava com seus olhos castanhos e percebi como o que eu havia dito poderia ser complexo.

_Complicado? Exemplo simples: o que precisas fazer para ter uma maça, como a que foi espremida para fazer esse suco que tens em teu copo?
_Plantaríamos uma semente de maçã?
_Sim, a planta cresceria daria flores e depois frutos, assim tu pegarias a tua maçã. Sabes que isso demandaria certo tempo?
_Alguns anos?
_Exatamente! Agora quero que imagine uma maçã, só a maçã, veja a textura da casca, sua cor, veja que o lado que bateu mais sol durante seu amadurecimento é mais vermelho, veja como brilha, sinta seu aroma...

Vanimë estava de olhos fechados, percebia como se concentrava para imaginar a fruta.
_Agora que já imaginou a fruta inteira, imagine seu sabor...

A pequena parecia degustar a fruta só com o pensamento.

_Isso, agora abra seus olhos!

Ela abriu os olhos e se espantou com minha mão estendida á sua frente com uma maçã sobre ela.

_Öhanno, onde pegaste essa fruta?
_Eu a colhi com a minha mente. Veja é assim que funciona a magia, minha vontade fez uma maçã surgir sem que eu precisasse plantar a macieira e tivesse que esperar ela dar frutos. Eu fiz minha vontade pegar um atalho no ciclo natural das coisas.
_Mas como se faz isso, öhanno?
_Isso é um pouco mais complicado, mas tentarei explicar de forma simples. Primeiro, toda magia só existe por que o altíssimo assim permite que seja. Outra coisa: é preciso duas forças para que a magia aconteça uma é a Nara, a vontade, e a outra é a Nauth, a energia armazenada para que o evento seja realizado. Nara depende do usuário da magia. Quanto mais Nara, mais próximo de manifestar o evento. Já a Nauth depende de quem é a fonte da energia. Perguntei-te quem é nossa protetora espiritual e tu me disseste que era Viviane. Agora te digo que ela também é a fonte de Nauth dos druidas.

_Existem outras fontes de Nauth, Öhanno?
_Sim, um exemplo é Mab, a protetora dos Humanos e Drows de nossa ilha, contudo não te esqueças, o Altíssimo também é o criador de Viviane e Mab, portanto, todo Nauth armazenado nelas provém Dele! Como perguntaste sobre outras fontes de Nauth, posso te explicar que essas diferenças também fazem nossas magias serem diferentes.

_Isso tem a ver com arcana e divina?

_Tem, esses nomes foram criados para diferenciar os tipos de magias produzidas pelos druidas e pelos mabs. Como nós estamos muito ligados ao Altíssimo através de Viviane, nossas magias são chamadas de divinas. Os mabs perderam sua ligação com o Altíssimo, com isso suas magias foram denominadas de arcanas.

_E para que serve os rituais nos círculos de pedra e nossas preces, öhanno?

_É uma forma de armazenas mais Nauth e de nos tornar parte desse círculo de fé. Toda vez que fazemos uma prece ao Altíssimo ele transforma nossos sentimentos em energia e a repassa para Viviane, quando alguém precisa dessa energia, Viviane nos transmite.

_E por que um druida não consegue realizar uma magia igual a de um mabs?

_algumas magias até são iguais no seu resultado, na verdade o que difere são os símbolos de acesso ao Nauth de cada protetora. Isso faz com que as magias sejam diferentes, os símbolos, que podem ser palavras, gestos ou objetos. Viviane tem seus símbolos, são eles que estudamos na ordem druida. A combinação Nara, símbolo e Nauth, gera um evento, que pode ser criar uma maçã, como fiz agora, ou curar ferimentos e doenças.

_Existem outros protetores espirituais?
Existem, pequena flor! O altíssimo designou diversos seres angelicais para proteger e ensinar diversos povos, cada um deles têm seus símbolos e seu usuários de magia.

_Nossa que interessante! Seria possível usar esses outros símbolos?

_Sabia que irias me perguntar isso, provavelmente teu pai te contou sobre o feitiço de transporte que Merlin me deu. Sim, é possível. Uma maneira é usando pergaminhos com símbolos não fixados, descartáveis, essa foi a maneira usada por mim para transportar nosso grupo para Civits. Outra maneira seria aprender os símbolos de outros protetores.

_Isso é bom ou ruim?
_Venimë, o bom ou ruim está em nós mesmos. Eu posso usar magia para curar uma pessoa e também para machucar, nós decidimos o que fazer com o que nos é ensinado. Isso vale para qualquer coisa, não só para magia. Tu sabes usar um bastão de luta, não é?

_Sei sim, Öhanno!

_Tu podes usar ele para se defender de algum animal feroz, defender alguém de algum perigo e também pode usar apenas para ferir alguém, a decisão é tua.

A pequena elfa de cabelos e olhos castanhos ficou me fitando, parecia refletir sobre cada palavra que eu havia lhe dito, depois de alguns minutos ela sorriu e disse:

_Öhanno Lenwo! Obrigado pela aula de magia!

Ela me abraçou e beijou meu rosto, peguei-a no colo e disse:

_Agora vamos treinar Luta com bastões, sabia que seu pai nunca me venceu?

_Ah eu sei, ele sempre me diz isso!

Fomos para o quintal e brincamos até a hora do almoço.

(Continua)